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A influência das séries, filmes e jogos no comportamento das crianças

Foto do escritor: Teresa Tomé RibeiroTeresa Tomé Ribeiro

Recentemente, os comportamentos muito violentos de algumas crianças, inspirados nos jogos da série da Netflix «Squid Game», inquietaram pais e educadores. De repente, assolam-nos diversas dúvidas: Será que o meu filho/a vê conteúdos semelhantes? Mas que violência é esta? Será que os amigos dos meus filhos veem esta série ou vídeos de igual impacto? E, se veem, como evitar os comportamentos violentos e a agressividade?




Partilhamos uma entrevista que a formadora da DIP3, Teresa Tomé Ribeiro, realizou à Porto Editora, com o objetivo de discutir "A influência das séries, filmes e jogos no comportamento das crianças" em 2021.

Influência de redes sociais na educação das crianças


É prejudicial para a saúde mental das crianças a visualização de séries ou vídeos nas plataformas digitais?


Teresa Tomé Ribeiro

O problema de as crianças verem séries ou vídeos está relacionado com dois fatores: com o tempo que despendem e com a qualidade do que veem.

As séries e os vídeos são importantes para a criança desenvolver um imaginário fantasioso e lúdico. Esse imaginário é essencial para desenvolver a criatividade e, por vezes, até pode ser um espaço em que a criança se pode refugiar da realidade, quando esta lhe é mais penosa. No entanto, não necessita mais do que ver um vídeo ou um filme por semana. Tempo superior a esta referência é-lhe prejudicial para desenvolver um cérebro rico e competente.

Por outro lado, o consumo exagerado de séries e vídeos que atualmente se verifica provoca uma diminuição da qualidade dos conteúdos disponíveis. Existem séries e vídeos muito fracos no que se refere aos conteúdos e, ao mesmo tempo, muito bons em termos gráficos de ação. Por vezes, chegam a ser agressivos ao ponto de perturbar a criança.

Os pais e educadores têm de ficar cientes de que, se querem ter as crianças sossegadas por mais tempo e a única solução que lhes apresentam é olhar para qualquer conteúdo no ecrã, depois terão de gerir reações e problemas que poderiam ter sido evitados

 


Como saber quais as séries/vídeos apropriados para os meus filhos?


Teresa Tomé Ribeiro

Temos dados para poder avaliar. Como pais, podemos e devemos construir os nossos indicadores de avaliação. Por exemplo: se a história é positiva; se a linguagem usada é adequada − não só no conteúdo mas também na forma; se as personagens principais têm atitudes e comportamentos que os nossos filhos podem assumir como referência, e muitos outros indicadores que cada educador sabe bem escolher e encontrar, em coerência com os princípios que se pretende transmitir na formação de cada filho.

 

Como controlar o que os filhos veem?


Teresa Tomé Ribeiro

Não diria controlar, mas, dependendo da idade, diria escolher e sugerir. Devemos ser adultos atentos e curiosos e procurar, com empenho, vídeos e séries para os nossos filhos verem. É trabalhoso, mas compensa! Disponibilizar e sugerir material lúdico de qualidade e ajustado permite que, quando os filhos fazem escolhas que consideramos menos boas, possamos dizer porque não concordamos com essa opção e oferecer outra, ou mesmo impedir que veja o que escolheu.

Quando insistem, por várias razões, em ver uma determinada série ou vídeo, aí vemos com eles. Sentamo-nos sossegadamente com eles a ver. Muitas vezes, a criança, com a nossa presença, torna-se avaliadora do que escolheu. A presença dos pais, que deve ser o mais passiva possível, ativa o seu sentido crítico.

Não podemos deixá-los sós nesta fase essencial da sua formação. A oferta de conteúdos digitais é muito vasta e tem de ser bem avaliada e escolhida. Crianças isoladas nos quartos, agarradas e adormecidas em frente a ecrãs, para os pais pode significar um sossego, mas, na realidade, corresponde a uma perda de oportunidade de crescimento e de construção pessoal.

 

Há violência nas escolas em Portugal?


Teresa Tomé Ribeiro

A violência é um problema a que as escolas estão atentas. Claro que existe violência nas escolas, e dentro de certos limites, é sempre uma oportunidade educativa. Faz parte do crescimento e desenvolvimento da criança ter dificuldade em gerir as emoções e, por vezes, expressar-se com agressividade. No entanto, o que nos preocupa atualmente neste comportamento é a intensidade com que acontece e a forma como, por vezes, se manifesta.

O reagir a um estímulo negativo agressivamente é algo comum e algo que o adulto deve ajudar a criança a gerir. Conforme se repete, vamos percebendo o padrão e atuando em sintonia. Todos sabemos que, na adolescência, esta gestão das emoções volta a ter uma expressão nova e intensa, com padrões por vezes inesperados e com a necessidade de abordagens educativas atentas, diversas e ajustadas a cada caso. Mas o que nos preocupa atualmente são as situações de violência premeditada, pré-organizada, ou seja, a violência intencional. Este é um fenómeno crescente e com contornos sempre novos. O que se começa a perceber é que muitas das situações são a reprodução de atos e atitudes que emergem de séries, de vídeos de influencers vistos por crianças e adolescentes.

As plataformas digitais, como o Instagram, YouTube, TikTok, disponibilizam diariamente uma quantidade de material que incentiva comportamentos socialmente desajustados.  Entre brincadeiras e jogos fúteis e sem grande sentido, encontramos também situações de desvalorização da pessoa. Por vezes, estes comportamentos aportam uma elevada carga de cinismo e sarcasmo, situações de agressividade gratuita, de violência extrema. As nossas crianças, adolescentes e jovens têm tudo isso disponível. Na verdade, não podemos esperar que este problema não se venha a agravar, se os pais e educadores não passarem a ter estratégias proativas, sérias e coordenadas.

 

A que sinais de comportamento devemos estar atentos?


Teresa Tomé Ribeiro

Devemos estar atentos a pequenos sinais de comportamento, tal como quando eram bebés.  Em bebés, como sabíamos que não expressavam verbalmente o que sentiam, fazíamos um esforço por identificar o que se passava, o que queriam, o que estava a acontecer. Quando não conseguíamos identificar, pedíamos ajuda, desde a familiares mais experientes até profissionais especializados (pediatras, enfermeiros, psicólogos, entre outros). Este tipo de atitude deve ser mantido durante o crescimento dos filhos. 

Como? Esforçando-nos por saber ler nas expressões, ler no olhar, ler em todo o tipo de comunicação não verbal. Isto porque, tal como em pequeninos, as crianças, os adolescentes e os jovens, por vezes, também não sabem − nem querem dizer − o que sentem, o que pensam, o que lhes acontece ou o que estão a planear.

 

Enquanto pais, o que podemos fazer para estar (mais) a par do que se passa nas escolas?


Teresa Tomé Ribeiro

Enquanto pais, devemos estar inteiramente a par do que se passa nas escolas.

Temos escolas muito grandes, cheias de alunos, muito compactas. Temos escolas com um ambiente que não gostaríamos de ter no nosso ambiente profissional e social. Não devíamos ter escolas tão grandes.

Numa fase de construção pessoal em que a criança, o adolescente, o jovem precisa de um ambiente que proporcione a descoberta de si e do outro, da sua identidade e do seu valor, mergulhamos as crianças em ambientes de salas cheias, corredores cheios, espaços de descanso cheios. Tudo cheio de barulho, com ruído de agitação humana, de movimento intenso. Este não é um ambiente educativo de crescimento equilibrado na fase de construção do ser humano, até os 17 anos.

A somar a este ambiente das escolas passam-se coisas sobre as quais os pais não são informados ou são informados e não prestam a atenção que merecem. Por exemplo: intervenções de entidades externas que nem sempre seriam as indicadas para as idades dos nossos filhos, com informações desajustadas; solicitações e pressões de colegas perturbadores. Por isso, aconselho todos os pais a estarem presentes nas escolas dos seus educandos sempre que seja possível e recomendo que preparem bem as reuniões com os professores, oiçam os filhos e, também, os profissionais que lidam diariamente com eles.

Para além disto, é sempre relevante: ter tempo de qualidade com os filhos; ter tempo de qualidade com os professores, aquando das reuniões; ter tempo para observar os filhos quando estão com os amigos; dar-lhes espaço e tempo para se exprimirem.

 

Como ajudar os filhos a serem cidadãos do mundo (interessados com o que se passa à sua volta e integrados na comunidade) e, ao mesmo tempo, ajudá-los a crescerem de forma saudável física e mentalmente?


Teresa Tomé Ribeiro

  • Primeiro ponto: as crianças devem crescer num ambiente em que sentem que são amadas como um todo, por aquilo que são. Os pais não devem fazer projetos para os filhos, mas sim ter projetos educativos ricos em ferramentas para que possam ser os próprios filhos os construtores dos seus projetos de vida.

  • Segundo ponto: não ter a preocupação de ser avaliado pelos outros. Não temos de provar nada a ninguém. Temos, isso sim, de avaliar se estamos a dar o espaço e as oportunidades mais úteis a cada filho, conforme é na sua especificidade e na sua individualidade.

  • Terceiro ponto: agradecer-lhes serem nossos filhos. Afirmar inúmeras vezes o que nos acrescentam de positivo: “Se não fosses tu, eu nunca ...” Mil coisas pequenas e grandes que podemos dizer-lhes!

 

Uma criança que cresce e se desenvolve num aconchego deste género terá muitas hipóteses de vir a olhar para si como parte integrante de todo um mundo humano e ambiental. Terá mais hipóteses de olhar e pensar os outros e o mundo com a consciência de que nasceu porque os outros e o mundo precisam de si.

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